Entre 2000 e 2005, 25 mil trabalhadores receberam auxílio-doença devido a moléstias causadas por esforços repetitivos
Afastamento é de um ano e meio, em média, somando 14,9 mi de dias de ausência; para especialista, país não tem cultura da prevenção
LEANDRA PERES
DA SUCURSAL DA FOLHA EM BRASÍLIA
O Ministério da Previdência Social gastou R$ 981,4 milhões entre 2000 e 2005 para pagar o auxílio-doença a 25,08 mil bancários afastados do trabalho por doenças causadas por movimentos repetitivos.
Cada um desses trabalhadores ficou um ano e meio afastado, em média, somando 14,9 milhões de dias sem trabalhar.
Essas estatísticas colocam os bancos em primeiro lugar no ranking dos Dort (Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho), que inclui doenças da coluna, tendinite, bursite e LER (Lesão por Esforço Repetitivo). Esses distúrbios já são a segunda maior causa de doenças entre os trabalhadores do país.
Os números explicam também por que o governo aumentou há alguns anos, de 1% para 3%, o percentual que os bancos recolhem mensalmente sobre a folha de pagamento para financiar o seguro de acidentes do trabalho, benefício pago pela Previdência Social aos trabalhadores afastados por motivo de doenças ligadas ao trabalho.
“Os casos de LER e Dort são caros para a sociedade. Será que prevenir custa R$ 39 mil por pessoa? [É preciso] que não se faça mais a socialização do custo. O empregador tem de assumir sua responsabilidade na prevenção de doenças”, afirma o secretário de previdência social do ministério, Helmut Schwarzer.
De acordo com os dados da Previdência, para cada grupo de 10 mil trabalhadores, 520 bancários foram afastados por Dort entre 2000 e 2004.
Na fabricação de tênis, setor que ocupa o segundo lugar no ranking desses distúrbios, o número de trabalhadores afetados é de 392 para cada grupo de 10 mil.
Além da incidência elevada, outro dado chama a atenção no setor bancário. Entre os 25,08 mil bancários que receberam o auxílio-doença, em apenas 8.700 casos os bancos reconheceram ter havido acidente de trabalho. De acordo com Schwarzer, isso mostra a subnotificação por parte dos bancos, ou seja, em muitos casos a doença não é notificada pelas instituições financeiras.
Indenização
O presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, o maior do país, Luiz Cláudio Marcolino, explica que é bastante comum os bancos oferecerem indenização aos trabalhadores afastados em troca da notificação do acidente.
É que, de acordo com a lei, um trabalhador afastado por acidente de trabalho tem estabilidade no emprego por um ano e direito a continuar recebendo, por exemplo, o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Assim, a indenização pode sair mais barata para a empresa do que a estabilidade no emprego.
Os bancos negam que esses acordos sejam praxe atualmente. Segundo Magnus Ribas Apostólico, superintendente de relações trabalhistas da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), esse tipo de negociação ocorreu há cerca de cinco anos, mas foi desaconselhado pela entidade.
“O que não podemos evitar é que o trabalhador afastado proponha um acordo para deixar o banco. Nesses casos, por iniciativa do empregado, a questão é discutida”, disse Ribas.
Para os bancos, as doenças por esforço repetitivo podem ter origens variadas, o que torna “muito difícil” estabelecer a vinculação entre os sintomas e o trabalho. A Febraban também afirma que há um grande número de fraudes.
“Acreditamos que antes de caracterizar essas doenças como de origem laboral seja fundamental que a perícia médica do INSS [Instituto Nacional do Seguro Social] realize uma investigação mais aprofundada (…). Os bancos não emitiram CAT [Comunicação de Acidente de Trabalho] porque não reconhecem a origem ocupacional do afastamento”, afirma a Febraban.
Reabilitação
Para a doutora em saúde do trabalho e professora da UnB (Universidade de Brasília) Anadergh Barbosa, os bancários sofreram as maiores alterações na estrutura do trabalho entre todas as outras categorias nos últimos anos.
Segundo ela, além da informatização, a mudança no sistema de gerenciamento dos bancos, feita a partir de metas, o maior número de assaltos e o menor prestígio da profissão no ambiente social fizeram com que a vulnerabilidade dos trabalhadores aumentasse.
Essa piora no ambiente de trabalho ainda não foi acompanhada de bons sistemas de reabilitação, segundo Barbosa. “Não temos uma cultura prevencionista.”